segunda-feira, 30 de março de 2009

"Ironia Ensimesmada"

Ora, queria eu também ser assim, a expressão de toda uma lógica sem lógica. E me machuca que a razão da minha inquietude seja também a razão da sua.

Fui um menino que podia ser tudo e tornei-me um adulto que, pior do que não ser nada, não quer ser nada. Fui a mais bela semente, que quando plantada tornou-se um tronco liso com os ramos para dentro e esporádicos frutos insípidos.

Não que eu não tenha experimentado o embrião dos prazeres da “vitória” social, não que eu não seja belo o bastante ou não tenha as habilidades necessárias. Acredite, é estranho para mim também que tudo isso tão raramente me apeteça e, de alguma forma me incomoda que tantas latências tenham se tornado na melhor das hipóteses um ideal.

E chamarei de justo o argumento que dirá que a pacatez e previsibilidade da minha vida contrastam incrivelmente com minhas aspirações e até com minhas escolhas amorosas.
Talvez meu erro tenha sido imaginar a vida antes de vivê-la e, quando finalmente comecei a vivê-la a imaginação provou-se mais viva e passei a considerar a vida pálida e previsível.

Mas pense, pense comigo, o sentido de ser assim. Buscar a aquisição do objeto, o acúmulo de bugigangas para que uma sociedade cinzenta me aplauda e algumas garotas de irritante insipidez e notável beleza sintam-se gratas em mostrar-me seios rijos conseguidos arduamente através do ócio, boa alimentação e uma mente isenta de qualquer problema realmente relevante.

Buscar o poder; o poder de gritar com os mais fracos, o poder de montado em um grande pedaço de lata da cor da moda me sentir melhor que os outros, como se por alguma razão eu fosse um ser humano mais digno, o poder de ter ao meu dispor inúmeras coisas que ninguém precisa, poucos têm e todos querem.

Encontrar-me repentinamente enamorado, perdido nesse amor mercantil nos braços da mais linda jovem que eu conhecer – obviamente linda, pois não é de bom tom apaixonar-se pelo que não é quase que por unanimidade belo ou, que ao menos, possua qualidades dignas de serem postas a público ainda que no momento estejam ocultas – um amor de mercado que leva em conta o valor social do objeto desejado em relação ao meu próprio valor cambial.

Vencer na vida (que maravilhosa expressão) dedicar cada um de meus suspiros desenvolvendo uma fortuna, úlcera e um coração insensível (como se já não bastasse o que já tenho). Muito inteligente.

Mas aqui estou eu, novamente, inflamando-me em dizer as mais juvenis críticas sociais, do modo mais direto e ineficaz que poderia fazer. Como se ainda não soubesse que não basta por a realidade à mesa, tem-se de torná-la suculenta, temperando-a com a prolixidade para apetecer o ouvinte desatento e dado antes à beleza que ao conteúdo do prato.

E na verdade nem sei porque insisto em tais críticas, já há muito que elas me soam enfadonhas, achei-as intrigantes a primeira vez que as ouvi, mas a repetição tirou toda a graça e beleza delas ainda que não tenha tirado a pertinência.

Á que saudade dos tempos em que se podia resolver quase tudo com um pouco de violência e, o que não dava, remediava-se com a idéia de suicídio. Mas as coisas não são mais assim e pacientemente aguardamos o Bom do homem, como se ele fosse natural ou como se algum dia já tivesse existido.


Mateus.

3 comentários:

  1. "Como se ainda não soubesse que não basta por a realidade à mesa, tem-se de torná-la suculenta, temperando-a com a prolixidade para apetecer o ouvinte desatento e dado antes à beleza que ao conteúdo do prato." - foi a parte que mais apreciei.
    Vc escreve bem, sempre gosto de lê-lo... Agora quero ver as palavras sairem daí e entrarem na consciência do povo pra ver se sai alguma atitude SUCULENTA, ou ao menos(para ser menos imaginativa e mais realista), menos ensimesma. É isso. Eita juventude sonhadora e triste ao mesmo tempo... EIS NÓS AQUI.

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  2. Bom, muito subjetivo, mas bom.

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