terça-feira, 4 de agosto de 2009

Um domingo qualquer.

Na rua passavam carros, e pessoas, e bicicletas, e coisas. Elefantes, elefantes não passavam, mas se passassem não seriam mais que um “e” na linha anterior.

Observava tudo, entediado, com o humor de uma criança politizada, que riria dos jornais, mas não sabe ler.

Onde estava? Onde estava a poesia? Quando as desgraças não impressionavam mais, quando as guerras e crises e doenças iam e vinham com a apatia de um leproso, quando o sexo já havia se burocratizado, e o outrora gigante violáceo chamado amor não merecia muito mais que um olhar.

Há vezes em que não se quer chorar nem mesmo a morte de um grande amigo.

Restava sempre, ao menos, a possibilidade de observar. E observava. Pessoas boas e más, distinção meramente estética. Já não confiava mais na bondade dos olhos alheios. A ingenuidade é cruel como as crianças e, a bondade é só o que resta a quem não tem chance de ser mau.

Um homem passou ao seu lado, elegante, apressado. Outro homem voltava, roto, apressado. Produziam.

Pensou na produção, para que servia? Inicialmente achou que fosse para a subsistência humana, achou a resposta completa e bonita, mas teve de abandoná-la logo, percebendo que a maior parte de tudo o que é produzido é tão inútil como os cabelos do dedão do pé. Deduziu que ela servia para nos preocupar, não mais que isso. Não deixar que em algum momento a humanidade se sentisse inútil. Mais ou menos como dar um pequeno serviço a um velho ou um vídeo-game a uma criança, eles, silenciosamente, sentem-se úteis.

É possível que tenha deduzido certo.

Resolveu dar uma volta, entrou no carro. Confortável. Um brinde aos preocupados com a produção! No rádio, vendiam amor com o mesmo ritmo e outro refrão.

Virando uma esquina qualquer, por certo com o nome de algum corrupto que escondia dois ou três crimes atrás de uma fortuna, atropelou um homem, gordo, mole, repulsivo.

Não parou, não porque tivesse medo ou fosse mau, mas porque nem no assassinato tinha visto a poesia que procurava. Talvez matar Aquiles ou Hércules reservasse algum charme, mas não aquele bípede sedentário.

No dia seguinte, leu uma pequena nota no jornal, falava a respeito da morte de um tal Roger, solitário, sem parentes, fortuna ou idéias que morreu com a mesma glória do cachorro que um dia teve. Mais uma morte sem poesia. Mais uma história boba de jornal.

Um comentário:

  1. e como um dia qualquer pode-se construir belas Frases , parabenizo-o pelo aparentemente apagado texto em seu sentido , mais com Grande ideologia de seu autor.

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